23 de fevereiro de 2010

O Parco Assombroso

      A noite impunha-se severamente sobre as incríveis proporções que compunham o casarão, erguido sobre um terreno plano, aparentemente há centenas de anos.
      No interior de tal edificação, estirado no grotesco e putrefato chão umectante, próximo a uma velha parede de alicerces arrebatadoramente dilacerados, repousava a tão desfigurada criatura infeliz, rodeada por mofo, baratas, e por outros seres displicentes e arrebanhadores.
      Uma mulher, de um fascinante e tenebroso sorriso, dirigiu-se até a figura horrenda, iluminando o estranho rosto enrugado, com olhos profundos, de expressão hedionda e constante, que se encontrava naquele lugar.
      Com um gesto cênico, porém contido, atirou-se aos braços do incrível medonho que repousava aniquilado no chão, gritando desesperada, indagando insistentemente por que ele teria fugido de uma tal cerimônia, mais propriamente uma seita, e por que não havia aceitado servir ao poderoso senhor das trevas, que se encontrava furioso por tal ocorrido.
      Num solavanco, a criatura repugnante levantou-se e meio que cambaleando, pisando por cima das outras criaturas que repousavam naquele mesmo lugar, livrou-se do rosto desesperado da mulher, que gritava incessantemente que teria vindo buscá-lo, capturá-lo para conduzi-lo até o mestre, o qual concluiria o sacrifício a que ele seria submetido, como forma de punição a falta que cometera.
      Ouviram-se ruídos e de repente todas as criaturas adormecidas no tenebroso salão, levantavam e urravam simultaneamente.
      A mulher mostrou-se surpresa e começou a praguejar, utilizando-se das mais baixas palavras que vinham em sua mente perturbada.
      Os monstrengos de faces incomodadas cercavam a louca que continuava gritando blasfêmias e clamando pelo senhor das profundezas.
      A lua passou a iluminar o salão com mais intensidade e a mulher pôde ver o rosto enfurecido de cada criatura que a cercava.
      Enfrentando-as, ela pôde conter o medo que parecia brotar em seu coração pela primeira vez.
      Janelas e portas começaram a se bater. A tempestade, que se formava do lado de fora, passava a invadir o interior do edificante e monstruoso casarão de ares fúnebres.
      Todas as bestas foram atiradas à parede devido a forte velocidade do vento e logo em seguida espatifaram-se no chão úmido, dispostas a partir novamente pra cima da endoidecida mulher agachada ao centro do aposento.
      Neste instante ouviu-se um sinal vindo de fora. As luzes se acenderam e os atores se levantaram se cumprimentando pelo longo dia de trabalho árduo e muito bem concluído. Era hora de o parque fechar e esta era a atração que terminava por último devido ao fato de as apresentações serem feitas no período da noite, objetivando contar com efeitos mais complacentes. Todos os espectadores aplaudiram calorosamente a incrível apresentação e se retiraram impressionados e muito satisfeitos com a magnífica encenação que haviam presenciado.